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POR QUE USAMOS RITUAL NA MAÇONARIA E COMO VIVENCIA-LO?



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 Maçonaria, enquanto instituição secular, se erige como um sólido baluarte para a humanidade. Em momentos de desolação, é convocada para iluminar a sociedade, provendo homens livres e de bons costumes, prontos para lutar pela evolução intelecto-moral de todos. 


        O que confere singularidade a essa venerável ordem? Qual a distinção marcante em relação a tantas outras sociedades que almejam o aprimoramento do ser humano, como organizações e clubes de serviços como o Rotary e os Lions? Indubitavelmente, a resposta reside em nosso ritual. Nos anos 30, durante uma entrevista radiofônica, o ilustre fundador da Ordem DeMolay, o irmão Frank Sherman Land, foi questionado sobre a diferença entre sua ordem e outras organizações juvenis. Sua resposta simples ecoa nas câmaras da sabedoria: “A Ordem DeMolay possui um ritual. Seus graus representam um desafio para todos os jovens que aspiram ser homens melhores em um mundo melhor, tornando-os melhores filhos e bons cidadãos.”


         Como um maçom distinto, o irmão Land resumiu com maestria a essência da Maçonaria: nosso ritual! Muito se tem escrito sobre os seus segredos, origens e palavras. Entretanto, é imperativo retroceder e considerar o porquê utilizamos o ritual, qual sua relevância para a sociedade e como devemos utilizá-lo. 


         O ritual é inerente à vida, uma prática que remonta a inúmeros povos, de maneira antiga até a idade contemporânea. Assim, desde os povos neandertais, que praticavam rituais funerários, até os ritos de passagem de povos indígenas como os Karajá, denominado ritual Herohoky, cujo objetivo é preparar o jovem índio para a vida adulta, o ritual é empregado como um processo transformador. 


         Mas o que é um ritual? Maçonicamente, é um conjunto de ações que incorpora lições morais, permitindo que os participantes vislumbrem o potencial transformador do homem-maçom como construtor social. Não é cerimonial. Uma cerimônia é um rito que confirma um status quo sobre seus participantes, como uma coroação, um desfile da vitória ou uma formatura. O ritual, repetimos, é transformador. Um ritual bem executado revela transições claras, atingindo os corações e compartilhando em ressonância o esplendor do ato entre os participantes. 


         Para realizar um bom ritual, é essencial não apenas memorizar palavras, declamando as orações de memória, mas também compreender as mensagens que elas transmitem. Não se trata apenas de dizer as palavras; é significar o que é dito com um sentimento vivo de transformação. 


         Todos nós nos beneficiaríamos ao dedicar mais tempo ao estudo do ritual, não apenas para decorá-lo, mas para desvendar suas pepitas de sabedoria e luz, impregnando na alma do maçom seus valores. 

         

         O ritual maçônico não se resume, entretanto, a ler as informações, e esse é um dos verdadeiros segredos maçônicos: o ritual é experiencial. É algo que não pode ser descrito ou expresso, assim como não se pode aprender a nadar ou andar de bicicleta lendo um livro, têm-se que experimentar. É uma viagem dos lábios aos ouvidos, visando os corações. O ritual não apenas impacta o candidato, mas todos os participantes, criando uma única egrégora de união e transformação.  

 

         É essencial rejeitar a tradição brasileira prejudicial de leitura do ritual durante as cerimônias. A encenação do ritual é uma arte, capaz de transportar a todos aos tempos antigos. Falas como “abra na página 17” ou “veja na página 32” te desconectam da cerimônia. Essa maneira errada de tratar o ritual é tão enraizada que é corriqueiro que o aprendiz receba o ritual após ser iniciado para acompanhar o fechamento da loja através da leitura. Isso é um crime! O aprendiz não deve ler neste momento, deverá antes sentir a cerimônia! Outro crime hediondo para o crescimento da ritualística é a disponibilização das instruções do grau no ritual de aprendiz. Ora, disponibilizar as instruções escritas antes de que o aprendiz tenha passado na loja equivale a entregar o script de um filme antes que seja disponibilizado no cinema. As instruções escritas devem ser oferecidas ao estudo somente após as instruções em loja (que deverão ser feitas decoradas). Se a sua oficina age dessa maneira, é necessário antes, compreender o verdadeiro poder do ritual e como ele deve ser executado.


         “Ah! Mas é difícil.” No entanto, ninguém disse que seria fácil. E lembre-se, se você se comprometeu com um cargo ritualístico ou se candidatou a ele, o mínimo que deve fazer é decorar a sua parte, encenando da melhor forma possível o ritual.  Para facilitar nesse processo comparativo, é só lembrar que o Ritual de emulação até pouco tempo não era impresso pela Grande Loja Unida da Inglaterra, forçando os membros a leitura e a capacitação para declamarem todos os textos de cor. Se os Ingleses conseguem, nós brasileiros também conseguimos. 

         O ritual é o cerne da Maçonaria, elevando-a do mundano para algo extraordinário. Proporciona uma experiência indescritível, tocando o âmago de quem somos em nossa busca para nos tornarmos homens melhores, como qualquer um que o tenha experimentado entenderá. Como disse Xunzi, o filósofo confucionista, “Uma pessoa deve primeiro ser mudada pelas instruções de um professor e guiada por princípios rituais. Só assim poderá observar as regras da cortesia e da humildade, obedecer às convenções e regras da sociedade e alcançar a ordem.”

Mário Serra Ferreira - DeMolay e Maçom

 

 

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